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TESOURO

“Porque, onde estiver o vosso tesouro, ali estará também o vosso coração”

Embora reconheça não ter a menor intimidade com as Escrituras Sagradas, este versículo da Bíblia sempre despertou minha atenção. Primeiro, porque penso que não são muitas as passagens paralelas, tampouco o testemunho de apóstolos distintos cuja narrativa dos respectivos capítulos possuam uma semelhança tão substancial e uma mensagem tão bela e atual quanto “olhai os lírios do campo...”. Depois, acredito, por nos permitir interpretá-lo conforme o contexto e a realidade de cada indivíduo. Qual é o teu tesouro? O que enche o teu coração de entusiasmo? Finalmente, por afirmar que existe um “presente” para cada um de nós, basta encontrá-lo! Porém, apesar da inspiração, a intenção não é refletir sobre nenhuma doutrina, talvez apenas revelar a existência de uma verdadeira “Terra Prometida”...
O homem do mar, desta vez, é a representação da nossa “alma andarilha”, que nos leva a navegar mundo afora atrás da felicidade. Entretanto, cansado das fantásticas aventuras que a vida de “engajado” reserva, vendo-se solitário e distante do sonho de paz e prosperidade, se apega as lembranças da infância no rincão natal, onde a alegria que agora procura era companheira inseparável. E a convicção de que um dia deve regressar ao ancoradouro que o viu nascer, crescer e partir é o “porto seguro” que o abriga das tempestades e conforta seu espírito. A nostalgia é proposital, como forma de explicitar que é da memória do pescador que estamos falando, portanto, de um lugar e um tempo passados. Mesmo assim, ele espera voltar e reencontrar um por do sol multicolorido, reconhecer sua praia, seu jardim, quem sabe até um antigo afeto na janela... Este pensamento, que nutre com tanta fé, é o que possui de mais precioso. É a consciência de que deve desbravar os sete mares, se for esse o seu destino, sem nunca esquecer que existe um cantinho numa pequena ilha ao sul do Atlântico onde seu coração fixou moradia e sempre retorna. O paradoxo do errante que tem como maior patrimônio a recordação da pátria mãe, o filho pródigo que finalmente percebe a segurança do lar e o amor da família como seu mais caro tesouro.
Suponho que quem me conhece e ao “Recanto da Vó Quita”, consiga visualizar perfeitamente o ambiente e o enredo da letra. Mas, apesar de bastante pessoal, não vejo dificuldades para qualquer pessoa identificar-se com a personagem do marinheiro e suas crenças e dilemas, por se tratar de um tema universal. Quanto à melodia, o Regi pode esclarecer mais apropriadamente o processo de composição. Posso adiantar que a referência inicial partiu das memoráveis serenatas que a D. Anita, Edírio e Ricardo Boppré faziam nas calçadas da freguesia durante as noites de verão no começo dos anos 80. Tentamos ainda nos basear na obra do grande mestre Dorival Caymmi, influência mais que justificada, pois, a nosso ver, ninguém cantou o mar e o pescador melhor do que ele. Enfim, esperamos que a música consiga transmitir o sentimento sincero que ambos compartilham: esse pedacinho de paraíso chamado Ribeirão da Ilha é, definitivamente, uma grande paixão. Ontem, hoje, sempre!

Em BREVE  a música correspondente AQUI!